Acordo de mais uma noite de pesadelos. Não são pesadelos concretos, no sentido em que ninguém morre e eu não estou a cair de um prédio de sete andares; ninguém próximo está em sofrimento. Não sei bem explicar o que acontece, mas é quase sempre uma série de situações desconfortáveis, uma inadequação qualquer, que me fazem acordar com uma estranha sensação de derrota. No meu caso, sei que isto é um reflexo da minha insatisfação geral com a vida neste momento. Parece impressionante que a fase em que mais rio, mais sorrio, mais felicidade genuína sinto, seja, ao mesmo tempo, exatamente a mesma em que também mais frustração, angústia e impotência experimento. Olho para a minha filha e sinto uma gratidão muito grande à vida por me ter dado a possibilidade de ver nascer este ser humaninho, e de poder acompanhar o seu crescimento. Mas, em paralelo, sofro pela liberdade que perdi, pelas mudanças todas que a sua chegada impôs, pela dificuldade enorme que sinto em conjugar quem sou enquanto mãe, e quem sou fora desse papel. A pessoa que gosta de ler, de fazer exercício, de conversar com adultos, de passar tempo sozinha no parque. A filha. A amiga, a namorada.
É esta persistente luta de papeis, esta batalha interna constante sobre quem é quem; perceber, racionalmente, que nada de irremediável acontecerá se a ida para a creche antecipar um possível desmame, mas ainda assim adiar essa ida constantemente, sob sabe Deus que pretextos, a custo de ter de trabalhar a horas absurdas, ver a casa de pantanas, não saber o que é ter cinco minutos para mim, comer mal, sentir que estou a deixar cair tudo. Sentir que estou a desiludir toda a gente.
Por estes dias, quando me sinto mais desamparada, penso para mim: no fim de tudo, só te tens a ti, e por isso mesmo tens de ser a tua melhor amiga. Quando estás triste, quando estás ansiosa, quando gastas 800€ num voo para ir para casa 10 horas mais cedo do que o suposto, és só tu e também és só tu que te podes salvar.
Sou só eu, e isso também pode ser muito empoderador. Só tenho de passar mais tempo com adultos e ser honesta sobre quão difícil é- deixar o resto fluir, como um rio que segue, como a estrada que começa.. Vá, agora todos a abanar os bracinhos no ar ao som destes meninos -parece que sempre é este ano que voltamos a cruzar-nos com os nossos ex nos festivais de verão; acho bem, já não era sem tempo.
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Viver sem adultos
Sou uma privilegiada por te conhecer.